As principais contribuições de Thomas Ogden para a clínica psicanalítica

As principais contribuições de Thomas Ogden para a clínica psicanalítica

”Assim como oceano só é belo com o luar

Assim como canção só tem razão se se cantar

Assim como a nuvem só acontece se chover

(…) Não há você sem mim e eu não existo sem você”

Tom Jobim / Vinicius de Morais

Thomas Ogden, psiquiatra e psicanalista americano, filiado à International Psychoanalytical Association (IPA), nasceu em 04 dezembro de 1946. Mora em São Francisco, Califórnia, e ao longo desses anos trouxe uma grande contribuição para o desenvolvimento da Psicanálise ao centralizar seus estudos, questionamentos e ampliação da teoria do desenvolvimento da personalidade, da interação intersubjetiva e do processo psicanalítico. Tem um grande volume de publicações, grande parte delas traduzidas e publicadas em português, atualmente mais intensamente pela Editora Escuta com a coleção Kultur. Ganhador dos mais importantes prêmios da Psicanálise, Ogden propõe um novo olhar para o processo analítico. Seus pilares e referências teóricas são Freud, M. Klein, Bion, Tustin, Fairbairn e Winnicott. Ele é visto como psicanalista e escritor. Suas obras são muito bem escritas e de grande profundidade.

Ogden se destaca como uma das mentes mais brilhantes no cenário psicanalítico atual, com perspectivas intuitivas e profundas sobre o funcionamento e desenvolvimento mental, bem como sobre o que ocorre na relação analítica, além de ser um autor inventivo e premiado e ter da literatura e da escrita uma visão interativa bastante peculiar.

Centralizarei o relato de suas principais contribuições nos conceitos que surgem da interação dialética entre sujeito e o objeto ressaltando uma nova forma de destacar a intersubjetividade. Os sujeitos criam-se mutuamente, não há analista sem analisando e não há analisando sem analista, mesmo quando as individualidades são mantidas e consideradas. O analisando não é só o sujeito da investigação, o analista compõe essa investigação, é sujeito dela também quando empresta suas rêveries advindas de seu posicionamento vindos do senso de vitalidade e desvitalização de ambos. Talvez esse seja o ponto nodal do processo analítico. Ela está nos bastidores de todos os momentos da sessão. Ogden dá grande importância à experiência de estar vivo e que as palavras e a escrita estejam vivas também. E em constante movimento, quando a dupla está estagnada a possibilidade de transmitir o sentido da experiência humana fica estagnado também.

O objetivo da tarefa no processo analítico, na escrita e na busca pelas palavras é usar a linguagem para aprimorar a tradução da experiência humana, poder captá-la em graus mais profundos. Não é falar, escrever ou psicanalisar sobre, mas é o esforço de criação da experiência de vitalidade humana. A vitalidade precisa ser vivenciada. Com essa vitalidade o analista tenta se manter inconscientemente receptivo para desempenhar papéis na vida inconsciente do analisando. Ele dá uma parte de sua individualidade que nasce de ambos.

Requer um grande investimento de ambas as partes. Disso depreendemos a ideia da enorme importância que é tornar-se um analista constantemente. Adquirir uma possibilidade de ser um determinando analista para cada analisando.

 “Aprender a falar com a própria voz e com as próprias palavras requer que a pessoa aprenda a ouvir e a usar os sons vivos da fala”. 

E direcionando para aquele paciente.

Esse desafio, a fala humana viva, é difícil de ser adquirida para analisar, escrever e falar. Para Ogden, o que faz abrir um abismo entre o par analítico é o impedimento de ouvir de modo imaginativo e livre os pensamentos, sentimentos e sensações inconscientes de ambos. O esforço embutido na tarefa analítica é a tentativa do par para ajudar o analisando a se tornar humano em um sentido mais amplo. Ele atribui esse esforço entre as poucas coisas que pode ser mais importante do que a sobrevivência.

Em sua visão, toda forma de psicopatologia em geral pode ser vista como a incapacidade de crescer. De vir a ser plenamente de uma maneira que pareça real. A experiência de não crescer, não mudar, não se tornar, é um estado de ser no qual a pessoa é incapaz de sonhar, de se engajar em um trabalho psicológico inconsciente e consequentemente incapaz de imaginar a si mesmo, de imaginar a si mesmo na existência. Em outras palavras, uma medida significativa da gravidade da doença psíquica é o grau em que o tornar-se cessou.

A experiência de ser e tornar-se em saúde é uma qualidade fundamental de estar vivo desde o início até o fim da vida.

Cibele di Battista Brandão é membro efetivo e analista didata da SBPSP e membro titular do GEP Marília e Região. 

Imagem: Shutterstock 

As opiniões dos textos publicados no Blog da SBPSP são de responsabilidade exclusiva dos autores.

PASSAGENS PEDEM PRESENÇA

“Faça uma lista dos grandes amigos
Quem você via há dez anos atrás
Quantos você ainda vê todo dia
Quantos você não encontra mais…”
(Osvaldo Montenegro)

  28 de maio de 2022 vivemos no Núcleo de Psicanálise de Marília e Região um momento muito importante!

Voltemos um pouco…

Em março de 2020 foi decretado: todos isolados, a força brutal da vida e da morte se apresenta de modo real! Um golpe profundo em nosso eu! Parecia que a capacidade de sonhar havia sido extinta de nossas vidas, perdemos o
paladar, o olfato, o ar que respiramos, força da vida, ficou perigoso e raro, trazia com ele algo letal! Nossos medos mais arcaicos foram re-ativados. O cuidado com o outro era necessário, descobrimos nossa força destrutiva, mas,
também tivemos a oportunidade de sentir em tom maior nossa força amorosa. O medo de enlouquecer e cair no vazio psíquico nos assolava.

No início de maio de 2022, nossa querida colega, Cássia Teixeira Assef, nos faz um convite. “Quero presença, de corpo e alma, na apresentação do meu relatório”! Assim voltamos a sentir sentimentos antigos, guardados em nós,
aguardando a hora de voltar para o presencial. Sentimentos que um abraço, um aroma, um olhar ao vivo, há muito tempo não experimentávamos.

A jornada para o vir-a-ser um psicanalista é longa, árdua, cheia de flores e espinhos. A passagem é sempre brindada entre grandes amigos que fazemos ao longo dessa caminhada. Havíamos perdido isso, o ritual de passagem
acontecia virtualmente, mas, não tinha o mesmo sabor, a mesma cor, as sensações ficavam prejudicadas pela falta de corpo.

Neste encontro, alguns de máscara, outros sem máscara, cada um voltando à vida de um modo muito singular, mas algo ali era comum a todos. O olhar, que não estava ofuscado pelas lentes de uma câmera, olhares vivos, vibrantes, que comprovava, estamos vivos, pulsão de vida sobrepujando pulsão de morte!

Foi inevitável sentir a ausência dos que tanto sonharam com essa volta, mas a força da natureza humana não os permitiu estar lá, presentes concretamente, a morte foi soberana! Nosso querido José Antônio Pavan que sonhou concretizar um espaço para a “Sede no Núcleo” deixou para nós a base, a fundação! Agora nos resta levantar paredes que possam conter esse sonho tão sonhado. As ausências foram presença viva neste encontro.

Dr. Alfredo Colucci, representante de todos os pioneiros, com sua habitual generosidade trouxe sua presença marcante, conduzindo-nos ao caminho da fé e esperança, reacendendo em nós uma chama para a vida psicanalítica.

O Núcleo, um lugar que alberga nossos sonhos de vir a ser psicanalistas, lugar de muitas lutas e conquistas, neste dia 28 de maio de 2022, nos acolheu em seu berço para receber uma analista, que nos apresentou um trabalho primoroso, cheio de vida e de verdades, que nos impulsiona a seguir confiantes de que um(a) analista é aquele(a) que sem medo vive um encontro de almas, correndo riscos, se embrenhando por lugares nunca visitados em nós e em nossos analisandos.

Uma data memorável, que venham outros encontros de corpo e alma!!

Maria Inês Alves

Membra filiada da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo e membra agregada do Núcleo de Psicanálise de Marília e Região.

Resumo: A Psicanálise diante do racismo: um olhar sobre o racismo sofrido pela população negra no Brasil

Evaldo Ferreira da Silva

No final de 2021, o Curso de Formação em Psicoterapia Psicanalítica formou o aluno Evaldo Ferreira da Silva, que desenvolveu uma pesquisa bibliográfica sobre o racismo sofrido pela população negra no Brasil, sob orientação da professora Vânia Maria  Martins Lopes. A seguir, conferimos um breve resumo de seu trabalho.

No Brasil, o racismo está presente no nosso cotidiano. Ele não é assumido socialmente, mas é aceito e há silêncios a respeito, decorrentes de razões distintas ou até contraditórias. Esses silêncios, quando não fortalecem o racismo, o mantém, pois resultam no não enfrentamento. E diante de lamentáveis episódios de racismo noticiados ou  presenciados, pouco ou quase nada vemos no sentido da mobilização da sociedade e das instituições. Temos, por vezes, comoção, entretanto  em geral estas  não chegam a romper o imobilismo, assim se perdem, se esvaziam, sendo pouco ou nada valorizadas num eventual e possível processo de desconstrução de preconceitos raciais enraizados.

Almeida (2019) compreende o racismo como ideologia que molda o inconsciente. Assim, independe de uma ação consciente para existir, já que ele é estrutural, abrangendo economia, política e subjetividade. No senso comum é frequente interpretações equivocadas  sobre racismo,  sendo também frequente, vítimas de racismo não serem compreendidas nas suas queixas e suas dores.  Discorremos a seguir sobre três concepções de racismo as quais Ameida (2019) traz  distinções.

Individualista: É a mais corriqueira, e para quem assim o concebe, entende o racismo como um ato, que está sempre vinculado ao ato, deliberadamente, desse modo é resultado de uma ação de um indivíduo, ou de grupos de indivíduos. Na concepção individualista, o racismo é uma anormalidade.

Institucional: Não se manifesta apenas a partir de atos individuais. Basta apenas não tomar ações necessárias para coibir, como por exemplos o silenciamento, salário menor para o homem negro, e menor ainda para a mulher negra, pois as instituições nos seus modos de funcionamentos criam condições para que isso ocorra e  permaneça.

Estrutural: É estrutural porque integra a organização econômica e política da sociedade de forma inescapável, fornecendo assim o sentido, a lógica e a tecnologia para a reprodução das formas  de desigualdade e violência que moldam a vida social contemporânea. É então uma decorrência da própria estrutura social, ou seja, do modo “normal” com que se constituem as relações políticas, econômicas, jurídicas e até familiares, não sendo uma patologia social e nem um desarranjo institucional, pois os comportamentos individuais e processos institucionais são derivados de uma sociedade cujo racismo é regra e não exceção.  O racismo não é só violência, ele forma os indivíduos, as instituições, cria cenários, com atores e papeis outorgados. Assim o racismo  não é uma anormalidade, exceção, mas algo que se constitui enquanto um parâmetro normalizado nas relações. Diante disso, ocorre uma acomodação, naturalizamos e aceitamos os papeis socialmente   construídos.  Para Schucman (2008) o racismo é estrutural e estruturante da subjetividade, pois o branco tendo se colocado à parte das questões raciais, ficou como um padrão universal de norma e normalidade, ocorrendo inclusive, o que Bento (2002) denominou de pactos narcísicos da branquitude, por isso haver entre outras coisas,  negação da problemática do racismo, alianças inconscientes intergrupais,  manutenção do poder e privilégios brancos.

Diante de toda a complexidade do que é o racismo, para ser antirracista é necessário um conhecimento sobre racismo e é fundamental perguntar-se. O que tem de racista em mim? Para assim reconhecer e ser possível uma mudança, uma transformação, segundo Paim (2020), sendo necessário para isto, olhar a branquitude por um viés crítico. A pesquisadora Lia Vainer Schucman, traz em seu trabalho “Teorias críticas da branquitude”  uma descrição    a respeito da brancura construída socialmente, como um lugar de poder e privilégios, citando entre outros autores,  RAMOS (1957) “A patologia do branco brasileiro”, compreendendo como uma patologia, o que fora acontecendo historicamente, de o branco estudar o negro como objeto negro, devido à construção social de que ele branco é universal, e os demais têm raça.

Pesquisamos na Revista Brasileira de Psicanálise, no período de 2009 a 2021 (disponível no site da FEBRAPSI), os artigos publicados sobre, cujo resultado discorremos a seguir, de  maneira a ilustrar bem:  Em 2009,     2010, 2011 e 2012, não houve nenhum artigo publicado pela Revista Brasileira de Psicanálise. Em 2013 houve um. Em 2014, 2015, 2016, 2017 e 2018, novamente não houve nenhum. Em 2019 houve um. Em 2020 foram três. Uma observação: além desse resultado, encontramos também um artigo não sobre sobre racismo, mas sobre adoção inter-racial. A pouca quantidade de artigos publicados, bem como os hiatos entre eles nos fez pensar e nos perguntarmos: se o racismo permeia e rege relações huamanas no nosso cotidiano, se temos episódios e mais episódios de racismo, e desdobramentos  como, mortes, adoecimentos, injustiças de todas as ordens, exclusões, incompreensões, violências, traumas psíquicos e físicos… por quê o racismo não tem sido objeto de interesse para estudo, no âmbito psicanalítco? Por quê os silêncios? Ainda que atualmente percebe-se alguma mudança, há muito o que avançar, pois “ sendo poucos os trabalhos, são menos ainda, os com especificidades” Paim (2020).  Curiosamente, a primeira tese de mestrado no Brasil a abordar sobre o racismo é de Virgínia Bicudo, cuja tese só foi publicada 65 anos mais tarde e, apesar de todo o seu pioneirismo, importância e contribuições para a Psicanálise no Brasil, e de muito ter contribuído para difundí-la, Virgínia sofreu uma invisibilidade, segundo Pereira (2018),  não tendo havido uma valorização de suas produções dentro da bibliografia psicanalítica acadêmica, o que Conceição (2020), chamou de apagamento da história, por causa do racismo e machismo existentes na nossa sociedade.

Este trabalho nos possibilitou caminhar para um letramento racial, uma alfabetização  sobre racismo, de modo que conseguimos aprender sobre  o que é o racismo estrutural, que ele estrutura nossa subjetividade, e ter podido caminhar para ter  consciência racial  fica evidente que “o racismo ocorre porque o branco precisa do negro  como depositário” Paim (2020),  que os psicanalistas brancos, precisam dar conta disso primeiro em si, para num segundo momento dar conta disso no outro,  que a branquitude como um lugar de poder traz privilégios, que geralmente as conquistas são  compreendidas apenas como uma questão de mérito, e não de uma sociedade que privilegia o branco e exclui o negro, e que portanto numa sociedade racista, não há democracia. 

O trabalho completo pode ser consultado na Biblioteca “Alfredo Menotti Colucci” do Núcleo de Psicanálise de Marília e Região. Agende sua visita! Para mais informações: biblionpmr@gmail.com ou (14) 3413-3307 – (14) 99614-6782.

 

SILVA, Evaldo Ferreira. A Psicanálise diante do racismo: um olhar sobre o racismo sofrido pela população negra no Brasil. 2021. Monografia (Especialização) – Curso de Formação em Psicoterapia Psicanalítica, Núcleo de Psicanálise de Marília e Região, Marília, 2021.

Vocês podem ver também sobre o tema na biblioteca em:

PAIM FILHO, I. A. Racismo: por uma psicanálise implicada. Porto Alegre: Artes & Ecos. 2021, 79p.

Evaldo Ferreira da Silva – CRP 06/136087

Psicólogo pela FAP – Tupã – SP
Formação em Psicoterapia Psicanalítica pelo NPMR
Membro agregado do NPMR

Um olhar que toca

Anete Maria Francisco*

Olhares
Que tocam
Que falam
Que eternizam.
Vejo meus olhos
Nos seus olhos!

É assim, nesse primeiro olhar que o bebê começa seu desenvolvimento psíquico. Como nos diz Winnicott (1971), para que este pequeno ser possa nascer psiquicamente e possa “se ver” precisa primeiro “ser visto”.

E é a mãe que oferece esse primeiro olhar ao seu bebê. Não apenas vê-lo como ao chegar em seus braços pela primeira vez: “que lindo você é meu filho!”, mas um olhar que embala, que aconchega, que supre suas necessidades.

Chegastes tão pequenino
Nesse mundo imenso
Buscando alegria e peito
Para um dia crescer
E correr o mundo!

A mãe é o primeiro vínculo do bebê com o mundo externo. É essa relação da mãe com seu bebê, esse primeiro vínculo, que possibilita que ele vivencie novas relações ao longo de seu caminhar na vida,    de um estágio de dependência absoluta, passando pela dependência relativa rumo a uma independência relativa. Relativa porque é na relação com o outro que nos constituímos como sujeitos que somos.

Para que isso ocorra é fundamental um ambiente facilitador que permita a esse bebê amadurecer e se desenvolver.

A mãe “suficientemente boa” é aquela capaz de reconhecer e atender as necessidades de seu bebê em tal estado de identificação com ele que experimenta uma devoção ímpar.

O bebê necessita desses primeiros cuidados intensivos devido ao seu estado de dependência absoluta e é afetado pelo tipo de cuidado que recebe ao ser acariciado, ao ser trocado, ao ser amamentado, ao ser limpo, ao ser visto. Essa é a capacidade da mãe de “sonhar” o “sonho” de seu bebê, segundo Bion (1962), captando o que se passa com ele mais pela intuição do que pelos sentidos.

Um choro pode ser apenas fome, mas pode ser um pedido para ser visto, para ser embalado. Ter a capacidade e a tolerância para aguentar este estado inicial com seu bebê, faz a mãe “suficientemente boa” criar este ambiente facilitador que consiga dar contorno e amparo para o bebê.

Ao embalar, ao amamentar, ao cuidar do bebê, a mãe o ampara e o protege, pode ir “contendo” aquele pequenino ser para que ele possa vir a ser no mundo.

Um olhar de ternura
Um olhar de medo
Um olhar de “vou dar conta?”
Um olhar de persistência
A procura de novos caminhos…
Um olhar que acalma
Um olhar que cuida
Um olhar que tolera
Um olhar que vê o outro.

Referências:
Bion, W. (1962). O aprender com a experiência. Rio de Janeiro: Imago, 1991.
Dias, E. O. (2017). A teoria do amadurecimento de D.W. Winnicott. 4ª edição, São Paulo: DWW Editorial.

Haudenschild, T. R. L. (2015). O primeiro olhar. Desenvolvimento psíquico inicial, déficit e autismo. São Paulo: Escuta.

Winnicott, S. W. (1971). O papel de espelho da mãe e da família no desenvolvimento infantil. In: O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975.

Anete Maria Francisco / CRP 06/129513

Psicóloga pela Unimar
Formação em Psicoterapia Psicanalítica pelo NPMR
Membro agregado do NPMR
Auxiliar do Serviço de Orientação e Encaminhamento do NPMR

Resumo: Autismo: um olhar da Psiquiatria à Psicanálise

No final de 2021, o Curso de Formação em Psicoterapia Psicanalítica formou a aluna Silvia Cristina Correia Ribeiro que desenvolveu uma pesquisa bibliográfica acerca do autismo sob a ótica da Psiquiatria e da Psicanálise sob orientação da professora Rosa Maria Batista Dantas. A seguir, conferimos um resumo de seu trabalho.

Várias são as discussões sobre as definições apresentadas para a  compreensão do autismo, tais como os aspectos genéticos, biológicos, relacionais, ambientais, culturais; Enfim, trata-se de considerar possibilidades multicausais para as origens do Transtorno Espectro Autista (TEA). Algumas publicações referentes à psicanálise sobre o que leva ao autismo causa grandes discussões acerca de hipóteses explicativas sobre esse transtorno que em alguns momentos engloba a questão da falha do circuito pulsional, a falha na alienação com o outro e não instauração do registro simbólico, entretanto, percebemos que não há uma única explicação a respeito do autismo. O que identificamos em comum entre elas é a existência de alguma falha ou de algo que não se efetiva na constituição psíquica da pessoa autista, porém há a observação de  uma causalidade significante produzida pela linguagem.

Na definição do conceito do autismo pela psiquiatria realizada pelo guia de classificação diagnóstica de transtornos, o último Manual de Saúde Mental (DSM 5), passou a integrar todos os transtornos do neurodesenvolvimento, fundindo-se em uma única classificação, o Transtorno do Espectro Autista (TEA).

Para psiquiatria as características essenciais do transtorno do espectro autista são prejuízos persistentes na comunicação social recíproca e na interação social e padrões restritos de comportamento. O estágio em que o período funcional fica evidente irá variar de acordo com as características do individuo e de seu ambiente.

Os déficits na reciprocidade socioemocional estão claramente evidentes em crianças pequenas com transtorno, que podem apresentar pequena ou nenhuma capacidade de iniciar interações sociais e de compartilhar emoções, caso tenha linguagem, costuma ser unilateral, sem reciprocidade social, usada mais para solicitar ou rotular do que para comentar, compartilhar sentimentos ou conversar.

Pelo olhar da psicanálise há alguns conhecimentos sobre o autismo.

Para Francis Tustin “os fenômenos autísticos caracterizam-se pela presença de um estado de “recolhimento emocional” no interior de uma concha protetora, autogerada. O self retira-se do contato afetivo com o objeto com o intuito de evitar vivências dolorosas que lhe acarretariam uma sensação de desagregação e vulnerabilidade intoleráveis. Os estados autísticos manifestam-se principalmente em indivíduos que apresentam sensibilidade extrema e uma autossensualidade exacerbada. Para tais indivíduos, a consciência da separação do objeto deu-se de maneira abrupta, sem que tivessem recursos para suportá-la. Essa separação seria vivida como se parte de seu próprio corpo tivessem sido arrancadas, acarretando experiências de aniquilamento, de buracos internos, de buracos negros.”

No entanto, Melanie Klein explicava o autismo levando em conta a inibição do desenvolvimento constitucional do bebê, o qual em combinação com as defesas primitivas levava a uma inibição do desenvolvimento do ego, a uma pobreza de vocabulário e também a uma dificuldade para realizações intelectuais, não apresentação de sinal de adaptação à realidade, nem de estabelecimento de relações emocionais com o ambiente, não expressão de afeto, não há reconhecimento nenhum do outro e raramente algum tipo de ansiedade. Apresentam movimentos descoordenados, expressões de olhos e rosto fixos. Essas crianças apresentam um fracasso das etapas iniciais dificultando a formação de símbolos, tornando-as imobilizadas, isoladas, sem relação com a realidade.

Ao pesquisar o DSMs, pode-se verificar que as classificações descritas nos manuais diagnósticos, constituem-se, no nível da fenomenologia, naquilo que se observa dos chamados sintomas, dentro do modelo médico.

A psicanálise vê o autismo como uma forma de estar no mundo, é um espectro no qual encontramos diversos graus que variam de leve, moderados e graves, considerando que os autistas têm dificuldades importantes em lidar com o mundo, seja no sentido amplo ou estrito e que suas famílias estão completamente envolvidas nestas dificuldades. São crianças que precisam de ajuda para saírem de seus mundos fechados, de sua concha protetora e encontrarem soluções próprias para estabelecerem algum nível de relação com o exterior. Alguns desses pacientes que apresentam estados autísticos comunicam–se predominantemente de forma não verbal, sobretudo da autossensualidade.

O trabalho completo pode ser consultado na Biblioteca “Alfredo Menotti Colucci” do Núcleo de Psicanálise de Marília e Região. Agende sua visita! Para mais informações: biblionpmr@gmail.com ou (14) 3413-3307 – (14) 99614-6782.

 

RIBEIRO, Silvia Cristina Correia. Autismo: um olhar da psiquiatria à psicanálise. 2021. 25 f. Monografia (Especialização) – Curso de Formação em Psicoterapia Psicanalítica, Núcleo de Psicanálise de Marília e Região, Marília, 2021.

Silvia Cristina Correia Ribeiro CRP 06/ 103686

Psicóloga pela Fadap – FAP
Formação em Psicoterapia Psicanalítica NPMR
Membro Agregado NPMR
Psicóloga Clínica

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